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Desconfiança eleva inflação

Em encontro com analistas, BC recebe muitas críticas pela política de juros mais flexível. Projeção para o IPCA do ano sobe para 5,82%

Acabou a lua de mel entre o mercado financeiro e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini. No primeiro encontro que ele comandou com economistas do mercado financeiro, levou uma saraivada de críticas. A maioria dos presentes fez questão de deixar claro o ceticismo quanto à capacidade da autoridade monetária de levar a inflação, que encosta no 6% ao ano, para o centro da meta definida pelo governo, de 4,5%, no início de 2012 por meio de medidas prudenciais e não de uma alta mais forte da taxa básica de juros (Selic). Os analistas alertaram que o BC está se arriscando além da conta ao apostar em ações não convencionais, como a elevação dos depósitos compulsórios que os bancos são obrigados a recolher em seus cofres.

A desconfiança do mercado se refletiu no boletim Focus, pesquisa semanal realizada pelo BC. Depois de dar uma trégua, os especialistas voltaram a elevar as previsões de inflação para este ano, pois entenderam que a prioridade da instituição passou a ser o crescimento econômico, mesmo que com reajustes de preços acima do desejado. A estimativa para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passou de 5,78% para 5,82%. Mas, ao longo dos próximos meses, o indicador romperá o teto da meta, de 6,5%, para só voltar a recuar no fim do ano — isso, se não houver nenhum contratempo no meio do caminho.

A deterioração das expectativas tem embutido no seu cálculo, segundo analistas, o efeito “Pombini” — uma referência ao apelido dado ao presidente do BC, que é classificado como dovish, termo importado dos Estados Unidos para indicar que um economista é dócil como um pombo. Com tanta doçura e depois da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada na semana passada, o mercado deixou de esperar uma estratégia de combate à inflação mais severa e já prevê um custo de vida pesado para o brasileiro em 2011 e 2012. “O BC está se arriscando demais em um cenário inflacionário como o nosso. Na reunião, ficou claro que estamos mais para estourar o teto da meta de inflação do que para convergir para o centro dela”, disse um analista que participou do encontro realizado em São Paulo.

Apesar das críticas, Tombini e os diretores que o acompanharam — Carlos Hamilton de Araújo (Política Econômica) e Luiz Awazu Pereira (Normas e Assuntos Internacional) — não reagiram. Ouviram calados as colocações dos economistas. Hoje, o encontro será no Rio de Janeiro. Depois dessa reunião, o BC fechará o relatório de inflação. Segundo economistas, um dos temas mais debatidos ontem foi a desaceleração da economia. Ponderou-se que, para a inflação convergir à meta em 2012, será necessário um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas) próximo dos 4%.

Não à toa, no Focus, o mercado voltou a reduzir as estimativas para o PIB deste ano. Foi o terceiro recuo em três semanas, agora para 4,10%. “O crescimento será mais fraco daqui por diante. Nas próximas semanas, as projeções dos analistas devem baixar mais”, disse Elson Teles, economista-chefe da Máxima Asset Management. “O mercado acha que as medidas prudenciais adotadas pelo BC contribuirão para frear a atividade, mas podem não ser suficientes para levar a inflação para o centro meta em 2012”, argumentou.


Monitoramento
O Banco Central quer ampliar suas fontes de dados sobre a economia brasileira e vai patrocinar dois novos indicadores. A Fundação Getulio Vargas (FGV) ficou incumbida da missão — a instituição fará novas sondagens sobre o comércio e a construção civil. Com esses levantamentos, a FGV afirma que, com as outras pesquisas já produzidas, passará a ter um dos mais completos sistemas de monitoramento da economia brasileira.

Produção cai, mas receita cresce
Gabriel Caprioli
 
A produção no Brasil começou o ano com o pé no freio. Apesar de o faturamento da indústria ter crescido 7,9% em janeiro, na comparação com o mesmo mês de 2010, devido ao aumento de preços imposto aos consumidores, houve recuo de 1,3% na oferta de mercadorias ante dezembro, o que agravou as preocupações do setor com o dólar desvalorizado, um forte estímulo às importações. Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a supervalorização do real é um processo irreversível e vai obrigar as empresas a se reorganizarem em torno de uma cotação de R$ 1,65 para a moeda norte-americana, se quiserem manter as portas abertas.

Segundo o gerente executivo de Política Econômica da CNI, Flávio Castelo Branco, a disparidade entre as vendas e os demais pontos do levantamento é um dos indícios de maior participação dos importados no conjunto da indústria. A média de horas trabalhadas e de contratações registrou avanço de 0,6% e 0,2%, respectivamente. A utilização da capacidade instalada (UCI) também cresceu, de 82,4% para 82,6%. “A empresa que monta o produto final e troca partes de peças nacionais pelas estrangeiras mais baratas, continua crescendo e faturando, mas essas fábricas intermediárias perdem produção”, exemplificou.

O analista da CNI Marcelo de Ávila reforçou a avaliação. “As empresas menores são as que mais sofrem porque estão no meio do caminho e como não há a expectativa de reversão da valorização do real ante o dólar, essa é uma realidade à qual as fábricas terão que se acostumar a trabalhar”, avaliou.

Na opinião do economista Bruno Lavieri, da Consultoria Tendências, a queda do dólar persiste porque reflete as condições macroeconômicas atuais. “O câmbio não está nos níveis atuais por acaso e, sim, porque os investidores acreditam que o Brasil responderá melhor ao que se vê no mundo hoje e continuará crescendo”, ponderou.


Governo teme desabastecimento
O governo reuniu ontem representantes dos ministérios da Fazenda, Agricultura e Minas e Energia em busca de uma solução para o possível desabastecimento de etanol no período de entressafra da cana de açúcar deste ano. A preocupação é de que a falta do produto nas bombas dos postos seja mais grave do que ocorreu nos anos anteriores, uma vez que os preços do açúcar estão batendo recordes no mercado internacional, favorecendo a produção do insumo alimentício em detrimento do combustível. A intenção é discutir estímulos para a fabricação do etanol. De acordo com o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, apesar da situação complicada, nenhuma decisão foi tomada.

Taxas recuam
Vera Batista
 

Os juros cobrados dos consumidores, ao contrário das expectativas dos analistas, registraram queda em fevereiro, em relação ao mês anterior, baixando, na média, de 5,70% ao mês (ou 96,49% ao ano) para 5,60% mensais (92,29% anuais), o menor nível desde novembro de 2010. No cartão de crédito e no cheque especial, porém, as duas linhas mais caras do mercado, apontaram movimento contrário segundo pesquisa da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).

Quem entrou no crédito rotativo do cartão de crédito pagou os mesmos 10,69% mensais de janeiro, (238,30% no ano, maior taxa desde junho de 2000). Os que recorreram aos limites do cheque especial, arcaram com taxas médias de 7,68% no mês e de 143,01% ao ano, essa, a maior taxa desde março de 2009. “A queda dos juros às pessoas físicas, apesar das medidas do Banco Central para frear o consumo e reduzir a inflação, foi uma grata surpresa”, disse Miguel Ribeiro Oliveira, vice-presidente da Anefac.

Segundo ele, os consumidores devem evitar ao máximo recorrer ao cartão de crédito e ao cheque especial, pois as facilidades oferecidas pelas administradoras e pelos bancos, como o crédito pré-aprovado, que pode ser usado a qualquer momento, é extremamente caro. É o tipo de conforto pelo qual não se deve pagar, a não ser em casos de extrema necessidade. “Há várias opções de empréstimos e financiamentos mais baratos”, disse.

No crédito direto do consumidor (CDC) ofertado pelos bancos a taxa média mensal cedeu, no mês passado, para 2,34% ao mês (31,99% ao ano). No empréstimo pessoal, houve baixa de 4,85% mensais (76,53% ao ano) para 4,65% ao mês (72,53% anuais). Mas, a despeito dessa queda, a inadimplência subiu em 2011. Pesquisa da Serasa Experian destacou que, no primeiro bimestre do ano, o índice de calote avançou 25,4% no confronto com o mesmo período de 2010, em reação à política de controle da inflação e ao encarecimento do crédito. Entre janeiro e fevereiro, a inadimplência recuou 2,3%.

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